Curso Básico de Criminologia
Curso Básico de Criminologia
Raimundo Palmeira
Aula n. 3.
3. Desenvolvimento histórico das idéias criminológicas. As escolas penais. Evolução da Criminologia.
A abordagem ao delito, na denominada fase pré-científica da Criminologia ( que vem a te o surgimento do Positivismo Criminológico, no Século IX), se verificou de forma superficial
Uma explanação, mesmo perfunctória, sobre o desenvolvimento histórico das idéias criminológicas, remontando mesmo à sua fase pré-científica, quando a abordagem ao delito era meramente acidental e superficial, como simples nuance do estudo filosófico, é mister à obtenção do conhecimento sobre sua atual estrutura. Ocioso nào se demonstra lembrar que, mesmo à obtenção de um conhecimento completo sobre o Direito atual, haver-se-á, necessariamente, que voltar atenção à história jurídica, pois afinal, ramo algum do Direito poderá ser compreendido em seu estágio atual, sem o conhecimento acerca do seu desenvolvimento histórico, conforme lição de Mezger ( MEZGER, Strafrecht. Apud BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Tomo I. Volume I. Rio de Janeiro: Forense, 1978. P. 67).
Pode-se dividir o estudo sobre a evolução histórica da Criminologia em quatro períodos, quais sejam:a) Período da Antiguidade, ou Fase Empírica ou Mitológica; b) Precursores da Antropologia Criminal; c) Período de Antropologia Criminal; d) Período de Sociologia Criminal; e) Período de Política Criminal ou Fase Eclética.
a) Período da Antiguidade, ou Fase Empírica ou Mitológica.
A denominada fase empírica ou mitológica, dentro da evolução histórica da Criminologia é situada a partir da pré-história e até o século XV, e pode ser identificada como uma espécie de embrião da ciência criminológica. Não se pode ainda falar, neste período, sequer em idéias criminológicas no sentido estrito e científico do termo. Afinal, o fenômeno do delito é explorado ainda muito debilmente, sob um ângulo mitológico, religioso e filosófico. Os primeiros esboços de uma abordagem científica ao crime somente vem a surgir com as denominadas ciências ocultas ou pseudo-ciências, mas mesmo assim, de forma despida do trato metodológico, ordenado, autônomo e finalístico caracterizador da ciência.
Israel Drapkin visualiza o surgimento da Antropologia Criminal propriamente dita a partir de 1875, com Lombroso, ano que serve de marco ao término da fase empírica ou mitológica, e ao início da fase da antropológica criminal:
“A verdadeira Criminologia é nova, pois se inicia em 1.875 com Lombroso, o que não quer dizer que anteriormente não existisse escolas e filósofos com idéias particulares sobre estes fenômenos; no entanto, deixaremos estabelecido que só tratamos da Antropologia Criminal propriamente dita, a partir de 1.875” (DRAPKIN SENDEREY, Israel. Manual de Criminologia. São Paulo: Bushatsky, 1.978. P. 9).
O homem pré-histórico desenvolveu, há cerca de um a três milhões de anos, a capacidade de convivência com outros da mesma espécie, segundo antropólogos, ao ser levado à caça coletiva, instado pela necessidade de alimentação, defesa contra outras espécies de animais, e em decorrência da intensificação da carne no seu uso alimentar, já na fase pré-humana, com a espécie “Australopithecus”( austral- sul; pithecus-macaco), o mais antigo remanescente dos homínidas conhecidos.
Marina de Andrade Marconi e Zélia Maria Neves Presotto, assim se referem a esse início, verdaeiro esboço ainda de vida coletiva:
“Desenvolveu locomoção bípede e postura ereta, constatadas pela anatomia da pélvis e das pernas, posição do crânio, da coluna vertebral e dos pés. Liberou totalmente as mãos para posterior manuseio de utensílios. O uso mais intensivo da carne, em sua dieta, levou à caça coletiva e, em conseqüência, ao desenvolvimento da cooperação, comunicação e inteligência”( MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia – Uma Itrodução. 5a ed. São Paulo: ed. Atlas, 2001. P. 75).
As referidas autoras mostram o aperfeiçoamento da família, como célula relevante no advento da sociedade, quando se manifestam, “in verbis”:
“Se, originariamente, a família foi um fenômeno biológico de conservação e reprodução, transformou-se depois em fenômeno social. Sofreu considerável evolução até regulamentar suas bases conjugais conforme as leis contratuais, normas religiosas e morais” (MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia – Uma Introdução. 5a ed. São Paulo: ed. Atlas, 2001. P. 106).
Com a evolução e o conseqüente aperfeiçoamento das relações grupais, surgiu evidentemente a necessidade de zelar pela condutas socialmente compatíveis com a necessária harmonia de seus membros, sendo as incompatíveis desprezadas pelo grupo, para o que se fundava inicialmente em mitos e divindidades, numa visão mágica, e posteriormente metafísica.
Durante a fase em estudo, não se pode falar ainda de idéias criminológicas propriamente ditas. O delito é ainda abordado de maneira muito
tênue, apesar de severamente punido, mas como o é toda transgressão social ou religiosa.
As referências ao crime são poucas, perfunctórias e esparsas nas obras dos filósofos e estudiosos. Sócrates (470-399 a . C.) pregava a necessidade de formação de caráter e instrução dos criminosos para que os mesmos não voltassem a delinqüir. Hipócrates ( 460-355 a . C.) atribui à loucura a existência de todo vício. Platão(427 – 347 a . C.) apresenta a combinação da cobiça e da cupidez como fatores criminógenos, e já, à época, admite a influência do meio no ser humano. Aristóteles ( 384-322 a . C.) apresenta a miséria como elemento ensejador da criminalidade e busca, mesmo que superficialmente, analisar o caráter dos delinqüentes. Sêneca (4 a. C. – 65 d. C.) analisara a ira, apontando-a como a mola propulsora do crime.
A idade média tem seu início estabelecida por alguns historiadores entre 395 d. C. e por outros em 476 d. C., terminando em 1.453. Nela também, encontraremos algumas referências ao delito, sem uma preocupação etiológica. Merece destaque Santo Agostinho (354-430), que é considerado pelos historiadores como um pensador da idade média, ao pregar a necessidade de se considerar a pena como medida de defesa social e objetivadora da ressocialização do culpado. São Tomás de Aquino (1.226-1274), aponta a pobreza como a grande incentivadora do roubo, e já traça, à sua época, a justificação do furto famélico, traçando verdadeiro esboço do estado de necessidade como excludente de criminalidade.
b) Precursores da Antropologia Criminal.
Entre o séculos XIV e XVI, podemos observar nas denominadas ciências ocultas ou pseudo-ciências, verdadeiros antecedentes da Antropologia Criminal. Isto porque as mesmas já demonstram alguma preocupação com a análise do ser humano. Esta etapa é considerada como etapa pré-científica da Criminologia, e sobre ela Molina e Luiz Flávio Gomes asseveram que:
“Antes da publicação da famosa obra lombrosiana, que costuma ser citada como “certidão de nascimento”da Criminologia empírica “científica”, já existiam numerosas “teorias” sobre a criminalidade. (…) Nesta “etapa pré-científica” havia dois enfoques claramente distintos, em razão do método de seus patrocinadores: por um lado, o que se pode denominar “clássico” ( produto das idéias do Iluminismo, dos Reformadores e do Direito Penal “clássico”: modelo que se vale de um método abstrato, dedutivo e formal); de outro, o que se pode qualificar de “empírico”, por ser desta classe as investigações sobre o
crime, realizadas de forma fragmentária por especialistas das mais diversas proced6encias ( fisonomistas, frenólogos, antropólogos, psiquiatras, etc.), tendo todos eles em comum o fato de que substituem a especulação, a intuição e a dedução pela análise, observação e indução ( método empírico-indutivo)” (MOLINA, Antonio García-pablos de; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia. 4a ed. re v. at. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002. P. 175).
A astrologia buscava descobrir o destino do ser humano através dos astros e seu posicionamento no zodíaco.
A oftalmoscopia objetivava estudar o caráter do homem, mediante a análise do interior de seu olho.
A metoscopia tinha por objetivo a descoberta do caráter do homem, pela observação das rugas de seu rosto.
A quiromancia tinha por escopo descobrir o destino e o caráter do indivíduo, mediante o estudo das linhas de sua mão.
A fisiognomia pretendia conhecer o caráter do homem pelo exame de seus traços fisionômicos.
A demonologia objetivava estudar a reação humana tida socialmente como indesejável, por intermédio dos demônios que o possuíam. Ela deu origem à psiquiatria.
A frenologia buscava captar o caráter do homem pelo estudo de seus traços fisionômicos e configuração de seu crânio e sua cabeça.
Os psiquiatras e médicos de presídios aparecem como precursores de Lombroso, exercendo notável influência sobre sua teoria. Philippe Pinel (1.745- 1826) , considerado o pai da moderna Psiquiatria, elabora conceito de uma mania sem delírio, que seria o desajuste do indivíduo que apresentaria distúrbios comportamentais em relação aos valores, sem entretanto padecer de uma patologia mental; Jean-Etienne Esquirol( 1.745- 1840), discípulo de Pinel, estuda uma série de delinqüentes alienados, buscando estabelecer relações entre a loucura e o crime. Cria o conceito de monomania, que é aperfeiçoada por Pritchard que aperfeiçoa tal conceito, denominando tal desajuste de “moral insanity”, a loucura moral que será incorporada ao conceito lombrosiano de criminoso nato. Em 1835, Pritchard conceitua a loucura moral como:
“São distúrbios nos quais existe uma perversão do sentimento, do temperamento, da tendência, dos hábitos
e da ação, sem irregularidade na faculdade intelectiva. Essa loucura do sentimento consiste na unilateral e circunscrita atrofia do senso moral, com conseqüência sobre a conduta” (PRITCHARD. Apud PALOMBA, Guido Arturo. Tratado de Psiquiatria Forense Civil e Penal. São Paulo: Atheneu, 2.003. P. 517).
Morel, em 1857, denomina tal sintomatologia de loucura dos degenerados.
As escolas penais.
À perfeita compreensão do desenvolvimento das idéias penais, mister se faz a observação, ainda que meramente perfunctória, sobre as escolas penais, correntes de pensamento jurídico-penais, cujo embate projetou-se para o futuro de sua época, trazendo até os tempos atuais repercussão.
Por escolas penais, Jiménez de Asúa entendeu serem:
“O corpo orgânico de concepções contrapostas sobre a legitimidade do direito de punir, sobre a natureza do delito e sobre o fim das sanções” (ASÚA, Jiménez de. Apud PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. V.1. 3a ed. rev ., at. e amp. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002. P. 60).
A Escola Clássica.
Ao pé da letra, não existiu propriamente uma escola clássica, mas deve-se essa denominação aos positivistas que assim denominaram a corrente de pensamentos (não tão homogênea, mas ligada por pontos de intersecção das obras de seus autores, como a necessidade de limites a serem impostos à pena, a natureza de ente jurídico inerente à pena, o livre-arbítrio, etc) que a antecedera.
Num clima ainda medieval de arbitrariedades e penas desvinculadas de limites prévia e rigidamente estabelecidos, as quais, na maioria das vezes, senão constantemente, eram absolutamente desproporcionais ao delito imputado, César de Bonesana, o Marquês de Beccaria ( 1738-1794), teve a coragem de escrever e fazer publicar uma fenomenal obra denominada “Dos Delitos e das penas”, de cunho mais filosófico do que jurídico, mas que possuiu, entretanto, o condão de fazer despertar para a necessidade da imposição de limites ao Direito Punitivo, abolição da tortura, e apesar de conceber a pena como retribuição ao mal causado ( o que é natural no desenvolvimento lógico de seu pensamento, pois tem por base de legitimação do Estado para aplicação da pena, o contrato social, o que leva à concepção
de um Estado centralizador e todo-poderoso), possui a virtude de combater a pena arbitrária, uma vez que prega a necessidade de que a sanção punitiva seja proporcional ao delito. Beccaria descortina os portais para o surgimento da Escola Clássica, e dentre os seus postulados, sobressaem a preocupação com a legalidade penal, já que prega que somente as leis podem fixar penas. Apesar de entender que tão somente os magistrados devem julgar os acusados, porém demonstra uma preocupação tal com a possibilidade de arbitrariedade, que sequer admite aos juízes a interpretação dos textos legais, postulando pela necessidade de leis claras, que não dessem margem à interpretação. A presunção de inocência já se deixa entrever em seus postulados, uma vez que Beccaria assevera não dever o réu ser considerado culpado, enquanto contra si não pese sentença condenatória, e já em sua época, eleva sua voz contra a natureza punitiva que se queira atribuir à prisão provisória, defendendo a necessidade de que ela deveria ser tão suave quanto possível.
Sobre o último postulado, Israel Drapkin assevera que:
“Geralmente, o acusado preso antes do julgamento, é tratado como se fosse um verdadeiro delinqüente, quando a experiência nos demonstra com bastante freqüência, tratar-se de pessoas sem nenhuma responsabilidade. Só a menção desta circunstância, nos faz meditar sobre a arbitrariedade e a crueldade desta medida” (SENDEREY, Israel drapkin. Manual de Criminologia. São Paulo: Bushatsky, 1.978.P.21).
E demonstra os primeiros esboços de preocupação com idéias criminológicas ao assegurar que o roubo, via de regra, encontra motivação na miséria e no desespero, bem como ao demonstrar preocupação com a prevenção dos delitos, que, no seu entendimento, seria mais útil que a repressão penal.
Note-se que toda a Escola Clássica teve o crime como um ente jurídico, pouco interesse dedicando à figura do criminoso, daí porque mesmo esses tênues arremedos de preocupação criminológica não podem ser elevados à condição de ensejadores da Criminologia, preocupação científica que somente iremos constatar mais adiante no surgimento da Antropologia criminal, no limiar da Escola Positiva.
Filangieri (1.752-1788), apesar de assumidamente jusnaturalista, admitiu em sua obra o embasamento do Direito Punitivo no pacto social, e teve a virtude de afastar da natureza da pena a vingança e a expiação, concebendo-a como instrumento preventivo ( utilitarismo).
Pellegrino Rossi ( 1.768-1.847), patrocina verdadeiro retrocesso na doutrina clássica, pois abandona o utilitarismo do direito penal, sobrepondo-lhe um moralismo metafísico. Atenua seu abandono ao utilitarismo, quando apesar de conceber na pena natureza retributiva, admite que ela deverá observar limites na utilidade social. Possui, o mesmo, todavia, o mérito de ser o autor da 1a construção sistemática de Direito Penal.
Carmignani ( 1768-1847), reafirma a distinção entre Direito e Moral, bem como entre Direito Natural e Direito político. Abraçou o utilitarismo, ao apresentar a pena como gesto de defesa social.
Romagnosi (1.761-1835), sendo jusnaturalista, assevera que o Direito independe de convenções humanas. Repudia, destarte, a admissibilidade de um contrato social. Advoga a natureza exclusivamente defensiva ( defesa social) como inerente ao Direito Punitivo. A pena é concebida como contra-estímulo ao estímulo criminoso.
Francesco Carrara (1.805-1888), foi detentor de excepcional capacidade de sistematização. Foi jusnaturalista, ostentando posicionamento metafísico e admitindo a pena em uma concepção retributiva. Pode-se observar a opinião do insigne clássico, no que pertine ao livre arbítrio e já aos primeiros traços de uma exigível culpabilidade do agente ativo de um delito, no trecho seguinte:
“A lei rege o homem enquanto é este um ser moralmente livre; portanto a ninguém se pedirão contas a respeito de um evento de que tenha sido causa puramente física, sem que lhe seja, absolutamente, causa moral” (CARRARA, Francesco. Programa do Curso de Direito Penal. Volume I. Campinas: LZN Editora, 2002.P.55).
A sua concepção metafísica sobre o direito de punir pode ser constatada nas suas seguintes palavras:
“E, em verdade, se o direito de punir, nas mãos do homem, procede da eterna lei da ordem, a ciência do direito penal deve ser independente de qualquer disposição legal humana, e dirigida apenas por regras de razão absoluta” (CARRARA, Francesco. Programa do Curso de Direito Penal. Volume I. Campinas: LZN Editora, 2002.P.42).
A retributividade penal é tão acentuada no pensamento de Carrara, que ele chega mesmo a asseverar acerca da regeneração de um delinqüente corrigido que:
“É edificante, é utilíssimo à moral pública, mas um delinqüente corrigido ao preço do abrandamento da pena merecida é um incitamento a delinqüir, é um escândalo político” (CARRARA, Francesco. Apud BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Tomo I. 3a ed. Rio de Janeiro: Forense,1978. P. 103).
Observa-se também, dentre os clássicos, Pessina e Lucchini, que não apresentam criatividade, não trazem idéias originais em sua obra, baseando-se nas premissas anteriores.
Dentre os clássicos alemães, merece ser citado Paulo Anselmo de Feuerbach ( 1.775-1833), que tem na pena, instrumento de ordem e segurança social e assevera que a ameaça de pena é o motivo inibidor que tem o condão de neutralizar o ímpeto criminoso. A partir de Feuerbach, pode-se constatar na doutrina jurídico-penal alemã, um tríplice direcionamento, com Kant ( 1724-1804), a cujo pensamento o próprio Feuerbach fora filiado, aquele concebendo na pena um imperativo categórico e que teria por parâmetro a lei do talião, refletindo seu absolutismo, no seguinte pensamento:
“Ainda quando a sociedade se dissolvesse com o consenso de todos os seus membros ( se, por exemplo, um povo, habitando numa ilha, se decidisse a separar-se e dispersar-se por todo o mundo), o último assassino que se achasse em prisão deveria ser justiçado, a fim de que cada um suporte a pena da sua conduta e o sangue não recaia sobre o povo que reclamou a punição” ()KANT, Emmanuel. Apud BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Tomo I. Rio de Janeiro: Forense, 1.978. P.108.
Hegel ( 1770-1831), apresenta a pena como conseqüência do crime, detentora de natureza retributiva, mas que deve ser proporcional como o crime, tendo por parâmetro não o fato delituoso em si, mas a vontade essencial do criminoso, aferida pelo delito que perpetrou.
Não se pode olvidar Geremie Bentham ( 1.748-1832), utilitarista inglês, que abordou os fatores sociais da criminalidade, pregou a necessidade de preponderância da prevenção à criminalidade sobre a sua repressão, e propôs a adoção de medidas preventivas semelhantes aos substitutivos penais que viriam a ser propostos por Ferri) . John Howard (1.726-1780) pregou a melhoria das prisões, é considerado como o criador do sistema penitenciário.
Os postulados da Escola Clássica podem ser sintetizados da seguinte forma:
a) O crime é considerado como um ente jurídico, desprezando-se sua realidade fenomênica enquanto ato humano;
b) A responsabilidade penal parte da responsabilidade moral, admitido o livre arbítrio;
c) A pena é retribuição ao mal causado pelo delinqüente, e deve ser proporcional ao seu delito.
A Escola Positiva.
A escola positiva, surgida a partir de Lombroso, teve advento a partir dos trabalhos de Lombroso sobre o criminoso, que começam a ser publicados em 1874, sendo sua principal obra o livro “L’Uomo Delinqüente”, em 1876. Encontra-se as raízes imediatas da Criminologia na Escola Positiva, pois César Lombroso, sobre cujo trabalho dedicar-se-á maior atenção a seguir, é o responsável pelo surgimento da Antropologia Criminal, assim como Enrico Ferri, vem a dar origem à Sociologia Criminal, e Garófalo é apontado como o criador da fase jurídica da Escola Positiva.
Em litígio aberto com a Escola Clássica, a Escola Positiva ostentou como postulados principais, a concepção do crime como fenômeno natural e social; a responsabilidade penal como responsabilidade social e lastreada na periculosidade do criminoso, afastada a aceitação do livre-arbítrio; a pena como medida de defesa social; a anormalidade psicológica como inerente ao criminoso, buscando-se a sua identificação inclusive por traços físicos; e a classificação tipológica dos delinqüentes.
A Escola Positiva é responsável pela inauguração da Antropologia Criminal e da Sociologia Criminal, conseqüentemente tem-se a mesma como responsável pelo advento da Criminologia.
Teve como seus principais representantes Cesare Lombroso, Enrico Ferri e Garófalo. Estes três autores positivistas foram responsáveis pelas três fases da Escola em epígrafe, a fase antropológica, a fase sociológica e a fase jurídica propriamente dita, respectivamente.
Posteriormente, surgiram, movimentos ecléticos, dentre os quais uma denominada terceira escola, conduzida por Carnevale, Alimena e Impallomeni, italianos, e na Alemanha, a chamada Excola moderna Alemã, conduzida por Von Liszt, todas elas entretanto, girando em torno de variações sobre os princípios clássicos e positivistas. O tecnicismo jurídico, conduzido por Arturo Rocco, na Itália, também apresenta fundamental importância para o desenvolvimento das idéias penais, porém, e na Escola Positiva e a partir dela que se fará concentrar a análise procedida neste trabalho, visto que é a partir de então que se pode observar a edificação de uma verdadeira Criminologia.
4.c) Período da Antropologia Criminal (Cesar Lombroso1835-1909).A Fisiognomia e a Frenologia podem ser apontadas como base científica do pensamento lombrosiano, assim como a teoria da origem das espécies de Darwin, os estudos psiquiátricos de Pinel, Esquirol, Morel, Lucas; assim como os estudos sobre estatística de Quetelet e Guerry.
A fisiognomia apesar de ser muito mais antiga que a Frenologia, uma vez que se consegue encontrar observações e análises fisionômicas nos textos dos filósofos da antiguidade, entretanto, somente ressurge a partir do século XVI, com o trabalho de Giovanni Della Porta, publicado em 1.586, intitulado “De Humana Physiognomonia”, e a obra “Examen de Eugenios para la Sciencia” de Juan Huarte, em 1575. Mas é em Joseph Gaspard Lavater que essa ciência considerada oculta encontra a sua mais forte expressão. Os quatro volumes da obra deste autos, denominada Ensaios Fisionômicos, foi publicada em quatro volumes que apareceram nos anos de 1775 a 1778.
A fisiognomia pretende identificar os traços da personalidade, do caráter, o temperamento, os dons e inclinações do indivíduo a partir das suas expressões fisionômicas. Moniz Sodré aduz que a Fisognomia é perfeitamente representada no princípio formulado por Leibntz de que “a alma exprime o corpo e o corpo exprime a alma” ( SODRÉ, Moniz. As três Escolas Penais: estudo comparativo. 8a ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1977. P.41).
Eis as regras básicas do movimento em estudo:
1- que a calma interior da alma e do espírito manifesta-se de forma diversa que a agitação; que a alegria exprime-se de outra maneira que a tristeza e que a impressão da dor e do prazer se exterioriza diferentemente e o mesmo sucede com todo ouro sentimento ou emoção;
2- que cada impressão de nossa alma, cada ato de nossa inteligência são reveladas pelas mesmas partes ou os mesmos movimentos do nosso corpo, especialmente pelos traços de nosso rosto, que assim se tornam um quadro animado e movediço do que se passa em nosso coração e nosso espírito;
3- que a expressão de um mesmo sentimento é ainda poderosamente modificada pela constituição ( o temperamento) de cada individualidade, Istoé, pela elasticidade ou a rigidez da fibra viva de que se compõem os órgãos e sobretudo pelo jogo e a flexibilidade de que gozam os músculos, os vasos e os nervos que formam as partes moles do rosto; sendo que a energia vital e a sensibilidade nervosa variam consideravelmente nos diversos indivíduos de uma mesma espécie, de onde se segue que os mesmos objetos ou as mesmas impressões estão longe de produzir sentimentos idênticos em todos os homens;
4- que cada impressão interior, psicológica ou corporal, tem uma impressão constante que lhe é própria; esta impressão, já modificada pela idiossincrasia, o temperamento ou a maneira de ser do indivíduo, é ainda suscetível de um certo aperfeiçoamento progressivo, pelo qual adquire mais ou menos correção, gravidade, delicadeza, graça ou elegância, conforme o indivíduo que a apresenta recebeu uma educação mais cuidadosa, e que as circunstâncias e a sociedade na qual tem vivido eram de natureza a dar às suas maneiras formas mais civilizadas.
(SODRÉ, Moniz. As três Escolas Penais: estudo comparativo. 8a ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1977).
Os estudos de fisiognomia apontavam o necessário estabelecimento das diferenças entre duas espécies de traços na fisionomia, que seriam os traços móveis, passageiros ou momentâneos, determinados pelas emoções e seus autênticos tradutores, os quais seriam denominados de traços mímicos; e outros, traços mais definitivos, imóveis ou constantes, reveladores do caráter e que podem ser considerados traços fisionômicos propriamente ditos.
Entretanto, a ciência oculta em epígrafe, enveredava pelas raias da metafísica, o que transformara Lavater em verdadeiro oráculo, fazendo com que inúmeras pessoas acorressem a Zurique no intuito de colherem junto a Lavater suas previsões fisionômicas.
Havia mesmo, sob a influência da doutrina fisionômica, verdadeira crença nas possibilidades de desvendar o interior do ser humano, por suas feições, ao ponto de se observar o advento do denominado édito de Valério, pelo qual era aconselhado ao julgador, escolher condenar, entre dois suspeitos, o mais feio.
A frenologia somente vem a surgir depois, encontrando seu ápice na obra de Johan Frans Gall, que no início do século XIX, lança seu trabalho sobre anatomia e patologia do sistema nervoso em geral e do cérebro em particular, com observações sobre o reconhecimento das diversas disposições intelectuais e morais dos homens e dos animais pela configuração de suas cabeças.
Apresentando verdadeiro avanço em relação à Fisiognomia, a Frenologia pode ser tida como verdadeiro avanço científico em relação aos postulados daquela sua antecedente.
Newton Fernandes e Valter Fernandes reconhecem essa contribuição:
“Não se pode negar, por fim, que a Frenologia tenha sido um avanço dado em direção à pesquisa do comportamento humano, hoje em pleno desenvolvimento” (FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia Integrada. 2a ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002. P. 75).
Basicamente, a Frenologia se alicerça sobre dois postulados básicos: a continuidade da natureza, segundo a qual ela se eleva, sem solução de continuidade, de grau a grau, formando a “escala gradual de aperfeiçoamento”dos seres sensíveis, e a especificidade dos órgãos, consoante a qual cada órgão tem sua função própria, em relação com sua estrutura, e nào tem senão essa única função.
Eis os princípios fundamentais da Frenologia:
1- as faculdades e as inclinações dos homens e dos animais são inatas;
2- o exercício dos nossos instintos, das nossas faculdades intelectuais, das nossas qualidades morais está sujeita à influência das condições naturais e orgânicas;
3- o cérebro é o órgão específico de todos os nossos instintos, nossas inclinações, nossos sentimentos, nossas aptidões, nossas faculdades intelectuais e de todas as nossas qualidades morais;
4- cada um dos nossos instintos, nossas inclinações, nossos sentimentos e nossos talentos e cada uma de nossas faculdades intelectuais e morais, têm no cérebro uma parte que lhe é peculiar, uma sede que lhe é própria e específica; e o desenvolvimento destas diversas partes engendra tantos pequenos cérebros ou órgãos particulares quantas são as funções essencialmente distintas;
5- o desenvolvimento dessas diversas partes em que se localizam as diferentes faculdades da alma, constituindo pequenos órgãos cerebrais, manifesta-se na superfície exterior da cabeça, por sinais ou protuberâncias visíveis, de sorte que, pelo exame dessas protuberâncias ou bossas cranioscópicas, podemos reconhecer, pelo tato ou pela vista, as disposições e as qualidades intelectuais e morais próprias a cada indivíduo.
(SODRÉ, Moniz. As três Escolas Penais: estudo comparativo. 8a ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1977)
Observa-se ainda que Lombroso sofreu forte influência da teoria Darwiniana.