A curva não pára de subir. Depois de 24 mil pedidos em 2008, este ano o laboratório deverá fechar as contas com mais de 28 mil - o que representa um aumento de 17%. A boa notícia está nas crescentes potencialidades da ciência no apoio à luta contra o crime. A menos boa é que quanto mais pedidos, mais demorada a resposta e mais difícil combater a acumulação de exames. O que abre um debate inevitável a curto prazo: definir se os recursos devem ser utilizados de forma irrestrita ou, dado o custo elevado, se deve haver alguma contenção.
"Há margem para alguns ajustamentos e redução dos elementos que nos são enviados para análise", admite ao i Carlos Farinha, director do LPC. Além dos órgãos de polícia criminal, chegam às salas ocupadas no quarto piso do emblemático edifício da Gomes Freire pedidos de exames no âmbito de processos cíveis ou de trabalho, assim como de entidades com quem a Judiciária tem protocolos. Sem contar com a ligação estreita, "quase diária", mantida com o Instituto Nacional de Medicina Legal.
Ritmos diferentes Cada porta do longo e sinuoso corredor abre-se sobre uma especialidade com ritmo de resposta próprio. Exames de análise de moeda - 40% da actividade do laboratório - são respondidos no prazo de 30 dias. Na toxicologia a morosidade média oscila entre 57 e 60 dias. A análise de documentos exige prazos superiores, de quase três meses. Mas biologia e balística, que somadas representam um quarto do total de pedidos do laboratório, são as que têm mais trabalho acumulado.
Não é preciso cartão de visita, porque a sala não engana. Pistolas e caçadeiras penduradas nas paredes, cartazes com explicações detalhadas das peças de armas, balas espalhadas em mesas e analisadas ao microscópio. Olhos treinados para detectar marcas quase imperceptíveis procuram identificar a arma da qual foi feito um disparo. Com a diferença de que nada é tão rápido como no CSI, sublinha Mário Goulart, responsável pela balística. "A nossa base de dados faz a pesquisa e dá as imagens mais parecidas com a que queremos. Mas não aparecem sequer ordenadas. O perito tem de analisar ao microscópio e pode ser um processo moroso."
No laboratório há um lema que relativiza o peso por vezes sobrevalorizado de um vestígio. "A teoria e a ciência orientam e a experiência decide." Sim, há exames que podem decidir um caso. Não, um indício não é tudo e deve ser sempre contextualizado. "Temos perfeita noção de que somos um órgão auxiliar", sublinha Carlos Farinha.
Claro que há especialidades mais automatizadas. Entrar na toxicologia é dar de caras com um mundo de cromatógrafos, espectrómetros e outros aparelhómetros que trabalham noite e dia para identificar substâncias. Canábis e cocaína lideram. Mas de vez em quando há análises invulgares. Desta vez são dezenas de vasos de cactos peiote apreendidos a uma família de belgas residentes em Portugal. Cactos produtores de mescalina, uma substância alucinogénea.
"Smart drugs" como esta estão associadas a "pessoas com determinados níveis culturais", acentua Joana Santos, chefe do sector. Entre as drogas de massificação, uma das missões da toxicologia é fazer comparação de lotes. "Os exames comparativos permitem estabelecer conexões que podem ser muito importantes para a investigação, explica.
O peso de uma prova varia consoante os crimes em causa. E tão decisiva como a capacidade analítica é a eficácia na recolha de vestígios. Em todos os departamentos da PJ há "mini-laboratórios", viaturas de cena de crime com condições para preservação das provas. O director do laboratório considera que se tem "evoluído muito" na organização da recolha, tendo o recente lançamento do manual de procedimentos da PJ contribuído para uniformizar protocolos. Apresentado em Maio, está em fase de monitorização e depois terá divulgação diferenciada consoante o papel de cada parceiro. INEM, bombeiros e Protecção Civil, por exemplo, têm interesse em aspectos práticos de preservação de um local de crime.
Luzes azuladas que revelam marcas de tinta em notas. Químicos que em segundos desvendam resíduos de prova. Parece um mundo entusiasmante, mas não há propriamente truques na manga ou aparelhos esquisitos que desvendam um crime em três tempos. O eleito na lista dos mais "engraçados" é um "carrinho" que permite detectar alterações na constituição do solo até uma profundidade de dois metros e meio - particularmente útil para localizar cadáveres.
Precisamente porque não são aparelhos de uso comum ou disponíveis na prateleira do supermercado, a burocracia acaba por atrasar investimentos previstos. "Só agora começa a chegar equipamento com verbas disponibilizadas para este ano", lamenta Carlos Farinha.
O investimento em automatismo não pode afastar o laboratório da qualidade máxima. Estão em causa provas que não podem ser questionadas em tribunal. Cada relatório é subscrito por dois peritos e um validador. Ou, nos casos mais simples, pelo menos um perito e um validador. "Nunca uma resposta individual."