Estudantes e profissionais participam do Seminário “História da psiquiatria no Brasil republicano”
Pesquisadores, professores e alunos de pós-graduação que se dedicam à pesquisa em história da psiquiatria no Brasil aproveitaram a sexta-feira (17/12) para assistir a diversas apresentações e participar de debates, em que especialistas fizeram um balanço dos estudos historiográficos sobre a doença mental no país.
Os trabalhos abordaram temas relacionados com os diagnósticos encontrados na primeira metade do século XX, bem como as classificações das manifestações clínicas da doença mental vigentes no período e os tratamentos que visavam a cura.
O atendimento a doentes mentais teve início apenas em meados do século XIX — até então, os “loucos agressivos” eram presos e os “calmos” andavam pelas ruas, sem qualquer tratamento.
Antes do encerramento do seminário, quem assistiu às palestras participou do lançamento de um número temático de História, Ciências, Saúde — Manguinhos, que inclui artigos de vários dos profissionais que falaram durante o dia.
Esta edição inclui na seção "Fontes" os textos completos de 15 artigos de psiquiatras como Juliano Moreira, Afrânio Peixoto, Henrique Roxo, Jefferson de Lemos, veiculados originalmente entre 1905 e 1930, no primeiro periódico brasileiro especializado na área de saúde mental, os Arquivos Brasileiros de Psiquiatria, Neurologia e Ciências Afins.
O encontro foi no Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, na Urca, onde funcionou o primeiro hospício da capital. De estilo neoclássico, o prédio do Hospital Pedro II, que depois se chamou Hospício Nacional de Alienados, foi construído entre 1842 e 1852 pelos prestigiados arquitetos José Jacinto Rebelo, Domingos José Monteiro e Joaquim Candido Guilhobel. Dom Pedro II contribuiu com parte da verba para a construção, que também contou com doações .
Preparado por uma comissão organizadora e o comitê científico, o seminário surgiu de forma articulada com os editores responsáveis pela revista, Jaime Benchimol e Roberta Cerqueira, junto com a editora convidada deste número, a pesquisadora Cristiana Facchinetti do departamento de Pesquisa da COC. Ela participa do Grupo do CNPq que investiga “o físico, o mental e o moral na história dos saberes médicos e psicológicos”. O encontro também contou o apoio da Faperj.
Cristiana Facchinetti, Ana Venâncio e Jaime Benchimol, da Casa, e
Margarida de Souza Neves, da PUC-Rio. Fotos: Ruth B. Martins
Esquizofrenia, paranóia, epilepsia e outras manifestações clínicas: novas análises
Ao longo de todo o dia, os participantes do Seminário puderam acompanhar as palestras e participar dos debates distribuídos por três mesas redondas, com a apresentação de oito especialistas de instituições do Rio de Janeiro, Espírito Santo, de São Paulo e Santa Catarina.
Professora da UERJ, Magali Gouveia Engel abriu o encontro com uma análise sucinta sobre o espaço destinado pela revista História, Ciências, Saúde — Manguinhos a temas relacionados com a história da psiquiatria. A pesquisadora destacou que isso ocorre desde o primeiro número, veiculado em julho de 1994, quando a revista publicou artigo do pesquisador da Ensp, Paulo Amarante, sobre a trajetória do psiquiatra italiano Franco Basaglia, que defendia a extinção dos manicômios. Engel chamou atenção para o fato de que, a partir de 1998, os trabalhos sobre o tema passaram a ser mais frequentes.
Cristiana Facchinetti fez a segunda apresentação, destacando que, a partir de 1970, surgiram os primeiros estudos sobre a história da psiquiatria no Brasil, apoiados em análises do filósofo francês Michel Foucault. “Nos últimos 30 anos”, disse, “a história da psiquiatria tomou rumos mais variados e as novas gerações ampliaram seus referenciais teóricos, objetos, enfoques e fontes”.
Alexander Jabert é doutor em ciências pela COC, com a tese De médicos e médiuns: medicina, espiritismo e loucura no Brasil na primeira metade do século XX, que ganhou o primeiro lugar na premiação nacional da Capes, em 2009, entre os concorrentes na área de história.
Sua pesquisa partiu da análise de prontuários médicos de um hospício no interior do Espírito Santo, dirigido por profissionais filiados à doutrina espírita kardecista. Ele falou do apelo popular que o espiritismo tinha na primeira metade do século XX: “a ausência do Estado era suprida por instituições religiosas. Até hoje há a crença de que um espírito provoca a alteração mental. Se estiver nervoso, vá levar um passe e tudo vai melhorar”, acreditam.
“Periculosidade: do desvio à doença mental” reuniu os pesquisadores Ana Maria Oda, da UFSCAR, Fernando Dumas, da Casa de Oswaldo Cruz e Sandra Caponi, da UFSC. Flávio Edler, da Casa, foi o mediador.
Oda apresentou a evolução histórica dos conceitos da paranóia e discutiu seu significado, a partir de artigo de Juliano Moreira e Afrânio Peixoto. Dumas falou sobre o alcoolismo e as representações sociais da doença na literatura brasileira do século XIX. Caponi falou sobre “a origem de uma psiquiatria ampliada”, analisando as mudanças ocorridas no conceito de degeneração no final dos 1800.
Ana Venâncio e Jaime Benchimol trocam ideias durante apresentação.
Pesquisadora da COC, Ana Tereza Venâncio e a professora de história da PUC-Rio, Margarida de Souza Neves, falaram sobre “os males da modernidade na República”, no caso a esquizofrenia e a epilepsia, em mesa redonda que contou com a presença de Jaime Benchimol como mediador durante os debates.
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