O ex-vice-primeiro ministro do Iraque, Tareq Aziz, recebeu ainda na semana passada a pena de morte. Na Holanda, porém, no dia 31 de outubro completou-se 150 anos que alguém foi executado em tempos de paz. A discussão sobre a utilidade e a conveniência da pena de morte jamais arrefeceu de vez.
Quando Johann Nathan foi enforcado há 150 anos pelo assassinato de sua sogra, não podia imaginar que o fim de sua vida constituiria um marco histórico. Pela ocasião, deu-se uma conferência em Maastricht cujo tema era Superando a pena de morte.
Na Holanda somente ainda houve execuções logo após a Segunda Guerra Mundial de dezenas de criminosos de guerra, sendo que a última ocorreu em 1952. Classificadas sob a rubrica “jurisdição especial”. Nos direitos penais militar e bélico, ainda se permite aplicar a pena de morte.
Aversão ao espetáculo
À abolição da pena de morte na Holanda precederam por volta de dez anos de discussão pública. De acordo com o professor Chrisje Brants da Universidade de Utrecht, ela deveria ser examinada sob a luz do desenvolvimento internacional no século 19: “A elite foi criando uma aversão ao espetáculo em torno às execuções. Além disso, nasceu a consciência de que a pena de prisão não serve apenas como intimidação, mas também como corretivo”.
“Não se sabe se os cidadãos ordinários também apoiam a abolição da pena de morte”, diz Brants. “Costuma-se supor comumente que não vem a ser o caso”. Também no século 19 a pena de morte permaneceu um assunto de discussão.
O primeiro país em que a pena de morte foi abolida foi Liechtenstein, em 1798. No meio tempo a pena de morte na maioria dos países ocidentais caiu em desuso.
Pena derradeira
“A pena derradeira já não é vista como algo sine qua non, mas como a violação dos direitos humanos”, diz David Garland, professor catedrático de Direito e Sociologia da Universidade de Nova Iorque, um dos conferencistas em Maastricht.
A grande exceção são os EUA. Em vários Estados ainda perdura a pena de morte. “Ainda que, por outro lado, os Estados de Michigan, Wisconsin e Rhode Island tenham abolido a pena de morte já nas décadas dos quarenta e cinquenta do século 19, bem antes que isso se verificasse na Holanda”, diz Garland com uma ponta de ironia.
Requisito de admissão UE
Em vários países da Ásia e da África, a pena de morte existe em teoria. Mas, na prática, não é em todos eles que se chega às vias de fato. Na maioria dos países latino-americanos, a pena de morte tampouco é aplicada. A União Europeia impõe aos países-candidatos a nela entrar que não apliquem a pena de morte.
Garland constata que a pena de morte é cada vez menos aplicada internacionalmente. Em vários países do antigo bloco soviético, por exemplo, foi aprovada a suspensão da pena de morte. Esses países esperam ser admitidos à UE.
Interrupção das execuções públicas
Segundo o professor Garland, verifica-se também nos países em que a pena de morte é aplicada com relativa frequência, como China e Irã, uma diminuição das sentenças de morte, talvez por causa da pressão internacional. Acontece ainda de a aplicação ser ajustada. Um exemplo disso foi o final das execuções públicas na China.
A maioria dos condenados à morte lá também não são mais fuzilados, mas recebem uma injeção letal, ao exemplo americano. Além disso, o Tribunal Supremo em Pequim atualmente se vê obrigado a analisar caso por caso. Assim sendo, não são mais aceitas as decisões dos tribunais regionais.
Pouco protesto
Garland considera notável o fato de que, nos tempos de sentenças de morte do líder iraquiano Saddam Hussein, haja havido tão pouco protesto do mundo ocidental. “Até mesmo líderes de países em que foi abolida a pena de morte, como a Grã-Bretanha e a Holanda, não pareciam preocupados.
O então primeiro ministro Jan Peter Balkenende e seu ministro de Assuntos Estrangeiros Ben Bot se mostraram até mesmo algo compreensivos com a pena de morte. Apesar de ressalvarem que não seria jamais o caso da Holanda.
Reintrodução da pena na Holanda?
Ainda assim, ouve-se de vez em quando alguma voz a favor da reintrodução da pena. Sobretudo se se trata de estupradores de crianças, as sondagens indicam cada vez mais que boa parte da população reintroduziria a pena de morte.
A reintrodução da pena na Holanda não se verificaria sem complicações. A UE, afinal, não quer nenhum país-membro que a autorize. Entretanto, agora que os partidos populares em cada vez mais países-membros desempenham um papel de peso no governo, não se pode excluir nenhuma possibilidade.
http://www.rnw.nl/portugues/article/pena-de-morte-continua-em-discussao